quinta-feira, fevereiro 03, 2005

A produção do Jornal da Noite


O cenário do Jornal da Noite em 2004

Para analisar o conteúdo do Jornal da Noite sem distorções é preciso ter um domínio relativo sobre a sua produção, conhecer o papel dos principais actores que participam na elaboração do Jornal da Noite.
A produção do Jornal da Noite é da responsabilidade do Departamento de Informação da TCV, mas acaba por ser um trabalho com a participação de todos os departamentos, pois, pela sua importância na programação e pelo seu carácter aparatoso em termos de produção merece a atenção de todos os funcionários da estação.
Não há dúvida que o Jornal da Noite ocupa um lugar estratégico na programação da RTC. Emitido no horário nobre da RTC, salvo algumas excepções, este programa é o mais excelso, em termos de preparação. Cerca de trinta e cinco pessoas estão envolvidas todos os dias por turnos, na realização e edição do Jornal da Noite. É um trabalho de equipa, onde a responsabilidade do jornalista e dos outros obreiros é difícil de circunscrever.
O Jornal da Noite é preparado durante todo o dia. Na sua produção participam jornalistas, operadores de câmara, editores de imagem e som, operadores de som e de VTR, realizadores e todo o staff da redacção; Secretária, Editor Chefe e Chefe de Redacção.
Na produção de notícias, temos, por um lado, a cultura profissional; e por outro, as restrições ligadas à organização do trabalho sobre as quais são criadas convenções profissionais que contribuem para definir a notícia e legitimam o processo produtivo, desde a captação do acontecimento, passando pela produção, edição, até à apresentação.
A produção do Jornal da Noite pode ser sintetizada em três etapas principais; a gravação, a montagem e a emissão. Os temas a serem notícias são escolhidos pelo Editor Chefe e pelo Chefe de Redacção, depois de «terem em mãos» as notas emanadas por algumas instituições, ou por outras entidades.
As notícias de outros quadrantes também são seleccionadas pela equipa que dirige o Jornal, o Chefe de Redacção e o Editor do Jornal, embora algumas partam da iniciativa dos jornalistas, isto quando o número de notas oficiais escasseia. Os responsáveis do Jornal funcionam, deste modo como gatekeepers[1], na medida em que filtram, através das suas preferencias, aquilo que acham menos importante.
De acordo com Traquina, “o termo «gatekeeper» refere-se à pessoa que toma uma decisão numa sequência de decisões (...) ” (Traquina2002, 77), Como se pode perceber a selecção da notícia não acontece por acaso. Só são notícias aqueles assuntos que forem escolhidos pela direcção do Jornal.
Depois de escolhidos os assuntos a serem notícias são elaboradas as escalas de saídas, ou seja, é atribuída a cada jornalista uma tarefa. Assim, antes da saída deste para a reportagem o jornalista e o operador de câmara consultam a escala do dia, elaborada pelo staff da redacção. De regresso, quando já tiverem tudo gravado, vão «visionar» toda a cassete ao mesmo tempo que o primeiro elabora o texto da peça. As imagens que interessam ao jornalista são registadas, usando o time code,[2] para facilitar a sua localização na altura da montagem. De seguida vai fazer gravar a voz off, para depois se iniciar a montagem.
Na montagem da notícia, o jornalista é coadjuvado pelo editor (operador de montagem). Começam por fazer a estrutura da peça; o «esqueleto», formada pela voz off e pelos depoimentos (Vts). A seguir fazem a inserção de imagens sobre a voz off. Por vezes, há ainda a necessidade de misturar os sons do ambiente em que decorreu a gravação dos depoimentos com a voz off e/ou dos entrevistados.
A edição promove o encadeamento de sequências, num raciocínio lógico, construindo a realidade de forma harmónica de imagens, entrevistas e sons que autenticam o que está sendo narrado, na perspectiva do jornalista. Tudo é montado para que o telespectador não tenha dúvidas de que o que ele assiste é o real, e não a elaboração deste.
Terminada esta fase a peça é recolhida pela Secretária da Redacção que vai anotar a duração da peça e a deixa[3] na folha de alinhamento do Jornal. Os alinhamentos são elaborados manualmente pelo Chefe de Redacção e pelo Editor. São estas as figuras que decidem também a sequência das notícias.
Na última etapa do processo de produção do Jornal, o apresentador tem um papel preponderante. É a ele que cabe o papel de mostrar que tudo o que veicula o Jornal da Noite é real, apoiando-se nas qualificações técnicas de apresentação. Acerca do apresentador do Jornal televisivo, Jespers afirma:
“O apresentador tem em geral o aspecto de uma pessoa agradável, educada e não agressiva. Pode-se chegar a conceber o seu papel como o de um psicoterapêuta: o apresentador do T.J[4] teria por função dar ao mundo uma imagem positiva, atenuar a angústia do público face aos dramas e às dificuldades sociais e económicas que fazem a actualidade.” (Jespers 1998, 180).
No Jornal da Noite, muitas vezes, a comunicação oral do apresentador (a) vem sempre acompanhada de expressões corporais, responsáveis pelo «subtexto», um elemento expressivo de suma importância para a compreensão de certos comentários. Ao utilizar «este acessório» da linguagem, o apresentador (a) entra no espaço da representação, que não deve ser dissociado da encenação.
[1] Pessoa que toma uma decisão na sequência de decisões, filtradores de notícia
[2] Relógio que conta o tempo com precisão do frame (quadro de imagem), usado para marcar pontos de edição nas fitas. Marca horas, minutos e segundos e fotogramas ou frames.
[3] Última frase de cada reportagem.
[4] Telejornal

Este texto é parte da memória monografica de bacharelato. Disponivel na Bbiblioteca da Universidade Jean Piaget de Cabo Verde.